31 Janeiro 2024

Check Up #22 - Vacinas contra o cancro

Vacinas contra o cancro: preventivas ou terapêuticas?

Vacinas contra o cancro: preventivas ou terapêuticas?

Estamos habituados a ouvir falar de vacinas que previnem as doenças, protegendo-nos delas antes de as apanharmos. As vacinas “treinam” o sistema imunitário para conseguir reconhecer e combater bactérias e vírus comuns. Uma ou várias doses da vacina são suficientes para garantir que, quando formos confrontados com o perigo, o nosso sistema imunitário produza as células e os anticorpos certos para nos proteger: a doença será evitada antes de afetar o nosso organismo. Por vezes, os efeitos da vacina duram toda a vida; noutros casos, é necessário um reforço periódico para manter um forte nível de imunidade.

Exemplos comuns destas vacinas preventivas são as vacinas contra o sarampo e muitas outras doenças infantis; contra a tuberculose, contra o tétano, contra a poliomielite, contra a gripe ou a covid-19 – só para dar alguns exemplos. Salvaram – e continuam a salvar – milhões de vidas.

Embora algumas nos protejam melhor do que outras, a maioria destas vacinas (como as vacinas anuais contra a gripe ou a covid-19) são suficientemente eficazes na prevenção das formas mais letais das doenças que combatem. E, em alguns casos, como as vacinas contra o sarampo ou a varíola, por exemplo, oferecem níveis de proteção tais que campanhas de vacinação maciças conseguiram erradicar essas doenças outrora mortais.

Quanto às vacinas contra o cancro, podem ser de dois tipos: as que previnem o cancro e as que o tratam. 

Na verdade, no caso do cancro, existem duas vacinas preventivas bem conhecidas. Uma é a vacina contra a hepatite B, que previne a infeção pelo vírus da hepatite B, uma das causas do cancro do fígado – pelo que se considera que previne este cancro. A outra é a vacina contra o Vírus do Papiloma Humano (HPV), que previne a infecção por várias estirpes deste vírus, susceptível de conduzir ao cancro do colo do útero. Estão também a ser investigadas vacinas que previnem outros tipos de cancro, mas ainda há um longo caminho a percorrer e não se espera que tais "balas mágicas" estejam disponíveis tão cedo.

De facto, a maioria das vacinas a ser actualmente investigadas e testadas contra o cancro atacam a doença após o seu aparecimento: são vacinas terapêuticas. Há um caso singular que vale a pena mencionar aqui como mera curiosidade: numa espécie de utilização "off-label", a vacina BCG,  preventiva da tuberculose, está a ser administrada como vacina terapêutica para tratar o cancro da bexiga em fase precoce.

Também estão a ser testadas vacinas terapêuticas contra muitos outros tipos de cancro, incluindo: cancro da bexiga, tumores cerebrais, cancro da mama, cancro do colo do útero em diferentes fases, cancro colorrectal, cancro renal, leucemia, cancro do pulmão, melanoma, mieloma, cancro pancreático e cancro da próstata.

As vacinas terapêuticas são um tipo de tratamento do cancro também conhecido como imunoterapia. Funcionam estimulando o sistema imunitário dos doentes com cancro a combater os seus tumores (e não evitando que estes surjam). Por outras palavras, os médicos administram estas vacinas a pessoas que já têm cancro. Actualmente, as vacinas terapêuticas não constituem uma primeira linha de tratamento: são utilizadas, por exemplo, para destruir as células cancerosas que ainda podem permanecer no organismo após a realização de outros tratamentos mais convencionais. 

As vacinas terapêuticas são feitas de antigénios – moléculas que levam o sistema imunitário a produzir anticorpos contra elas. Tirando partido do facto que certos antigénios só estão presentes à superfície das células cancerosas, estas vacinas de antigénios aumentam a capacidade de o sistema imunitário detectar as células cancerosas e destruí-las – idealmente, poupando as células saudáveis. Mas como as coisas nunca são tão simples como parecem, na maior parte das vezes a dificuldade em desenvolver estas vacinas reside na identificação de antigénios que sejam verdadeiramente específicos dos cancros.

Nalguns casos, as vacinas terapêuticas contra o cancro podem ser personalizadas, ou seja, feitas a partir de amostras do próprio tumor de uma dada pessoa – e, assim, conter os antigénios específicos do cancro dessa pessoa. Por outro lado, também podem conter antigénios mais "universais", que não são os de apenas uma pessoa.
 

Sources:

https://www.cancer.net/
https://www.cancerresearch.org/
https://www.mskcc.org/
 

Por Ana Gerschenfeld, Health & Science Writer da Fundação Champalimaud.

Revisto por Professor António Parreira, Diretor do Centro Clínico Champalimaud.
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