No entanto, a análise destes exames pode ser complexa e demorada, exigindo que os médicos examinem inúmeras imagens à procura de detalhes, muitas vezes, minúsculos.
Por isso, qualquer técnica nova de análise de imagem que seja mais rápida e precisa é sempre bem-vinda: um novo artigo (recentemente publicado no Journal of Nuclear Medicine) revela que a Unidade de Medicina Nuclear-Radiofarmacologia da Fundação Champalimaud conseguiu exatamente isso, através da utilização de Inteligência Artificial (IA) baseada em deep learning (DL, Aprendizagem Profunda em português).
Atualmente, a prática mais avançada em oncologia, utilizada na Fundação Champalimaud, consiste na realização de um exame PET/CT, que permite aos médicos especialistas em Medicina Nuclear (MN), observar, em 3D, a distribuição de um radiofármaco injetado (uma molécula radioativa usada para monitorizar a movimentação e a distribuição de uma substância no interior do corpo). Estas imagens tomográficas são examinadas corte a corte, num processo demorado, e posteriormente interpretadas no seu conjunto, revelando se determinados tecidos poderão, ou não, ser malignos.
O que fizeram então os investigadores?
Para testar como a IA poderia melhorar a análise dos exames através da identificação automática e precisa de tumores, os investigadores aplicaram três técnicas diferentes a quase 1.000 exames.
Focando-se nos dois radiofármacos mais utilizados ([18F]FDG – utilizado para detetar e monitorizar cancros como o Melanoma, Linfoma e Cancro do Pulmão; e [68Ga]Ga-PSMA – usado para detetar e monitorizar o Cancro da Próstata), os investigadores recorreram a métodos baseados em IA para perceber se haveria forma de tornar o processo mais eficiente.
Para a criação de um modelo de IA avançado, os investigadores usaram uma técnica comum de deep-learning, uma nova técnica com deep-learning usando imagens de Maximum-Intensity Projection (MIP), e depois combinaram ambas as técnicas de forma a destacar automaticamente possíveis locais de tumores. Cláudia Constantino, Engenheira Biomédica do Grupo de Investigação de Medicina Nuclear-Radiofarmacologia na Fundação Champalimaud e primeira autora do artigo, explica que o principal objetivo foi: "Identificar e delinear lesões automaticamente, com o mínimo de erros possível, nestas imagens PET/CT imprescindíveis. Isto ajuda os médicos especialistas em MN e oncologistas a avaliar rapidamente o tamanho, forma e disseminação dos tumores, tornando o diagnóstico e o planeamento do tratamento mais rápidos e consistentes."
Numa primeira etapa, a IA foi utilizada para analisar os exames PET/CT diretamente com uma técnica padrão de deep-learning.
Numa segunda etapa, a partir das mesmas imagens PET/CT, foram criadas imagens MIP. Estas imagens são criadas com uma técnica de pós-processamento para condensar os dados 3D num novo formato, onde os sinais mais intensos – muitas vezes tumores – são destacados, facilitando a deteção de anomalias. Isto pode ser claramente observado no GIF abaixo: a imagem PET/CT está à esquerda e as imagens MIP correspondentes à direita – nas quais os tumores assinalados pela IA são destacados a verde. Estas imagens MIP poderão depois ser usadas em conjunto com IA para melhorar a deteção automática das lesões malignas nos exames PET/CT.

Por fim, a combinação das duas técnicas revelou ser a mais eficaz nos estudos PET. A combinação entre um modelo convencional com IA e um modelo baseado em IA com imagens MIP proporcionou a análise mais completa e correta dos exames disponíveis, oferecendo segmentação detalhada com praticamente nenhum falso positivo – segmentação essa muito difícil de alcançar na prática clínica diária devido ao tempo que é necessário.
Mas o que significa para os doentes e para os médicos?
Os métodos baseados em IA têm o potencial de se tornarem ferramentas valiosas para os médicos, ajudando-os a analisar exames de forma mais rápida e eficiente, permitindo a extração de mais informação dos exames. A maior precisão na medição da carga tumoral pode fornecer uma visão mais clara da progressão da doença e da resposta ao tratamento. No final, a IA pode funcionar como um assistente importante na imagiologia médica, ajudando os médicos a tomar decisões mais rápidas e precisas, sem comprometer os cuidados prestados ao doente.
Apesar das vantagens, Cláudia Constantino sublinha que a IA nunca substituirá a experiência médica: “Os nossos resultados mostraram que podemos ajudar os médicos especialistas em MN a fazer uma análise inicial das imagens PET/CT com recurso à IA, permitindo uma análise mais completa da carga tumoral. No entanto, a supervisão médica continua a ser essencial – os resultados gerados por IA devem sempre ser revistos, corrigidos e validados por especialistas. Os médicos especialistas (Medicina Nuclear e Oncologia) continuam a ser fundamentais para interpretar os resultados, fazer o diagnóstico final e considerar todo o histórico clínico do doente.”
Para o doente, isto significa a tranquilidade de saber que os seus exames contêm todas as informações que o médico precisa de ver, permitindo que os especialistas se concentrem no que fazem melhor – diagnosticar, tratar e cuidar dos seus doentes.
Artigo original: The Use of Maximum-Intensity Projections and Deep Learning Adds Value to the Fully Automatic Segmentation of Lesions Avid for [18F]FDG and [68Ga]Ga-PSMA in PET/CT
Texto de John Lee, Content Developer da Equipa de Comunicação, Eventos & Outreach da Fundação Champalimaud.
Tradução de Teresa Fernandes, Co-coordenadora da Equipa de Comunicação, Eventos & Outreach da Fundação Champalimaud.