24 Fevereiro 2022

É urgente reduzir as desigualdades globais de acesso ao tratamento e gestão do cancro da mama

The Lancet Breast Cancer Commission: fazer face a um desafio de saúde, género e equidade, a nível global.

The Lancet Breast Cancer Commission: tackling a global health, gender, and equity challenge

A Lancet Breast Cancer Commission, uma equipa multidisciplinar mundial de líderes e de defensores das doentes com cancro da mama, publicou há dias um artigo de Comentário na revista médica The Lancet, apelando a acções urgentes para garantir a equidade no tratamento das mulheres afectadas por esta doença, sejam quem forem e vivam onde viverem. Fátima Cardoso, médica oncologista, de renome internacional, que dirige a Unidade da Mama da Fundação Champalimaud, é uma das autoras e representante do grupo de trabalho alargado.

O caso do cancro da mama é o mais óbvio para avaliar as disparidades de género e de equidade que existem na área da oncologia a nível mundial – não só entre países de alto-rendimento e de baixo-rendimento, mas também, a nível social, em cada país. Por um lado, este cancro afecta quase exclusivamente mulheres, dando inevitavelmente origem a discriminação de género e estigmatização. Por outro lado, as desigualdades em termos de acesso aos tratamentos de alta qualidade do cancro da mama continuam, ainda hoje, a ser abismais.

Para os autores do texto, a questão mais difícil de enfrentar é, de facto, essa falta de equidade. “O acesso ao diagnóstico precoce, à análise completa em termos de diagnóstico e à gestão oportuna e da alta qualidade do cancro da mama depende de quem é a doente de onde vive”, escrevem. A marcada correlação positiva entre as taxas de sobrevivência a cinco anos do cancro da mama e o produto interno bruto do país é inaceitável, tal como é inaceitável dentro de cada país, onde as taxas de sobrevivência estão relacionadas com a etnia e a pobreza, acrescentam.

Durante as últimas décadas, as melhorias na gestão do cancro da mama têm feito diminuir acentuadamente as taxas de mortalidade desta doença nos países ricos. Avanços científicos abriram o caminho à personalização da cirurgia, da radioterapia e de outros tratamentos para cada doente individual, permitindo um aumento sem precedentes dos resultados clínicos positivos e a redução dos efeitos colaterais indesejáveis. 

No entanto, a situação global actual é aterradora. “Como é possível aceitar que as estimativas de sobrevivência de algumas mulheres negras na África subsariana sejam tão ou mais baixas que as de mulheres tratadas nos EUA há quase um século? [E que] essas mesmas diferenças nas estimativas ainda se verifiquem, até nos EUA, em relação a muitas mulheres de cor e de comunidades marginalizadas? “Por que é que o rácio de risco de morte [por cancro da mama no Reino Unido] é 50% superior entre as doentes socialmente desfavorecidas?” pergunta o grupo de trabalho.

A nível global, estamos num ponto decisivo, afirmam. “A menos que os rápidos avanços da clínica e da ciência do cancro da mama sejam aproveitados para garantir o acesso equitativo a todas as mulheres, as desigualdades actuais entre países e dentro de cada um deles vão crescer e transformar-se num enorme fosso.” A Comissão já desenvolveu um plano de trabalho, que é delineado no artigo e define tarefas específicas “para investigar, descrever e elaborar recomendações práticas.”

Esta Comissão tem um forte sentido de urgência. É tempo de agir.”, concluem os autores.

Leia o artigo completo, publicado na The Lancet, aqui.

Por Ana Gerschenfeld, Health & Science Writer da Fundação Champalimaud.
Loading
Por favor aguarde...