O trabalho, recentemente publicado na prestigiada revista científica PNAS, mostra também que esta molécula é transportada por vesículas extracelulares produzidas pelas células tumorais e direciona estas vesículas para o fígado e para o pulmão, precisamente os órgãos onde é comum aparecerem metástases de cancro do estômago. Com estas descobertas, a equipa contribuiu para a compreensão de um novo mecanismo de comunicação das células tumorais, identificando desta forma um potencial novo alvo para desenvolver terapias direcionadas para travar a metastização.
A coordenação deste trabalho esteve a cargo de Ana Magalhães, investigadora do i3S, e professora auxiliar do Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar, no Porto. Esta linha de investigação, desenvolvida no grupo liderado por Celso Reis, tem como objetivo perceber o papel dos glicanos (açúcares existentes na superfície das células) no desenvolvimento do cancro gástrico, um tipo de cancro com elevada mortalidade, por apresentar sintomas apenas numa fase já adiantada da doença.
A equipa tinha já identificado que infeção com estirpes mais patogénicas da bactéria Helicobacter pylori, factor de risco para o desenvolvimento de cancro gástrico, causavam um aumento de Syndecan 4, uma molécula decorada com glicanos específicos. “Recorremos então a amostras de tumores gástricos de pacientes do IPO e descobrimos que nestes tecidos esta molécula estava muito presente e que a sua presença estava associada a um pior prognóstico” explica a investigadora.
Segundo Bruno Costa-Silva “os resultados obtidos indicam que a medida de Syndecan 4 em tumores gástricos pode tornar-se uma ferramenta auxiliar importante na predição da agressividade desta doença”
“Em termos moleculares verificámos também que o Syndecan 4 está associado a uma maior capacidade de mobilidade e de invasão das células tumorais”, adianta Juliana Poças, primeira autora do artigo e aluna do programa doutoral em Patologia e Genética Molecular do ICBAS. A investigadora explica: “Percebemos que esta molécula vai empacotada nas vesículas extracelulares (EVs) que são secretadas pelas células tumorais (é uma das formas que as células usam para comunicarem entre si). Se as EVs tiverem esta molécula serão internalizadas pelas células do fígado e do pulmão, os órgãos onde é comum aparecerem metástases do cancro do estômago. No entanto, quando removemos o Syndecan 4 das EVs verificamos que bloqueamos a sua entrada nas células do pulmão e do fígado”.
Estes dados, adianta Ana Magalhães, “revelam o potencial desta molécula como um novo alvo terapêutico em oncologia de precisão para limitar a invasão do cancro gástrico e controlar a comunicação das células de cancro com a sua vizinhança próxima e à distância”. Além disso, “esta molécula surge como um potencial biomarcador de pior prognóstico em cancro gástrico”.
"A capacidade de modificar órgãos saudáveis de forma a torná-los mais receptivos a células tumorais metastáticas é costumeiramente observada em EVs de tumores agressivos. Desta forma, os resultados deste trabalho indicam que por meio de Syndecan 4 EVs de tumores gástricos possam desempenhar uma função chave na progressão metastática desta doença. O trabalho indica ainda que estas vesículas podem não apenas auxiliar no diagnóstico de doentes com tumores gástricos, mas potencialmente servirem como alvo de novas terapias antitumorais”, conclui Bruno Costa-Silva.
Imagem: Imagem de microscopia confocal que ilustra a marcação por imunofluorescência do Syndecan-4 (cor verde) numa linha celular de carcinoma gástrico.
Ana Magalhães, i3S-UP
Artigo científico: www.pnas.org/doi/10.1073/pnas.2214853120
Adaptado do comunicado de imprensa da Unidade de Comunicação do i3S.