Com cerca de 30 palestrantes – incluindo quatro oradores principais – desde cientistas de renome internacional a investigadores emergentes, o simpósio foi estruturado em oito sessões temáticas, cada uma explorando diferentes dimensões, desde a interação entre as células tumorais e o seu microambiente até aos impactos sistémicos do cancro no corpo.
Palestras Principais
Presidido pelos Investigadores Principais da FC, Ana Luísa Correia, Carlos Minutti e Klaas van Gisbergen, o simpósio abriu com uma palestra de Brian Brown, da Icahn School of Medicine, que abordou os desafios da resistência à imunoterapia. O investigador explicou como a genómica funcional espacial, um método que mostra quais os genes que estão ativos em áreas específicas de um tumor, pode ajudar a identificar porque razão os tumores escapam aos ataques imunitários, levando a imunoterapias mais eficazes.
Na palestra de Laurence Zitvogel, do Gustave Roussy Cancer Center, a investigadora destacou como as bactérias intestinais afetam a capacidade do corpo em combater o cancro. As bactérias intestinais desempenham um papel fundamental na eficácia de certos tratamentos oncológicos, como os inibidores de checkpoints imunitários, e os antibióticos podem reduzir a sua eficácia ao perturbar este equilíbrio. A sua investigação sugere que a transferência de matéria fecal de doentes que respondem bem ao tratamento poderia ajudar outros a superar a resistência à imunoterapia.
Cyrus Ghajar, do Fred Hutchinson Cancer Center, focou-se nas células cancerígenas dormentes que se espalham pelo corpo, mas permanecem escondidas do sistema imunitário por serem tão poucas em número. Compreender essas células é crucial para encontrar formas de prevenir o reaparecimento do cancro.
Elaine Fuchs, da Universidade Rockefeller, explorou como as células estaminais da pele respondem a fatores de stress ambiental, como a inflamação e sinais relacionados com o cancro. Essas células podem “lembrar-se” de encontros anteriores, o que afeta a forma como respondem a desafios futuros, com implicações tanto para a cicatrização como para o desenvolvimento do cancro.
Sessões Temáticas
Entre as oito sessões, um dos principais focos foi como o cancro afeta a formação de células sanguíneas e as respostas imunitárias. As discussões destacaram que os tumores podem enviar sinais para a medula óssea, aumentando a produção de certas células sanguíneas que ajudam o tumor a crescer. Isto significa que os tumores não se limitam a crescer localmente – mas sim, que podem reprogramar o sistema imunitário e a produção de células sanguíneas em todo o corpo para apoiar a sua própria sobrevivência.
Outro dos pontos importantes foi que os sistemas nervoso e imunitário estão profundamente conectados, e as suas interações podem influenciar significativamente o desenvolvimento e progressão do cancro. Usando modelos de ratinhos especialmente modificados, os cientistas estão a descobrir como o cancro afeta o sistema nervoso, enquanto outros estudos focam-se em como a competição entre células no timo (um órgão chave do sistema imunitário) pode impactar o desenvolvimento da leucemia.
Os investigadores também analisaram como as células individuais contribuem para o início e crescimento do cancro. Foi ainda partilhado como as técnicas avançadas de imagem lhes permitem ver como as células mutadas se comportam em tecidos vivos, mostrando que o ciclo menstrual pode influenciar tanto o início dos tumores como a sua resposta à quimioterapia. Houve também discussão sobre como as células de melanoma interagem com o seu ambiente para manter o seu estado “semelhante a estaminais”, o que as torna mais resistentes ao tratamento. Outro dos tópicos discutidos foi como uma proteína chamada survivina ajuda as células estaminais da pele a desencadear a formação de carcinoma basocelular, um tipo comum de cancro de pele.
O simpósio também explorou o papel das células dendríticas, que são células imunitárias que ajudam a iniciar a defesa do corpo contra ameaças, incluindo o cancro. Diferentes tipos de células dendríticas nos gânglios linfáticos trabalham em conjunto para influenciar os tipos de células T que lutam contra o cancro e que entram nos tumores. Sinais do sistema nervoso podem afetar a função dessas células imunitárias, potencialmente melhorando a capacidade do corpo de combater o cancro. Outra apresentação discutiu como a vigilância do sistema imunitário sobre os tumores pode moldar a composição genética das células cancerígenas, o que pode levar a novas estratégias de vacinas contra o cancro.
Como é que o sistema imunitário aprende a tolerar substâncias inofensivas? - foi uma das perguntas colocadas durante a apresentação onde foram introduzidas as células Thetis, um novo tipo de célula imunitária que ajuda o corpo a tolerar alimentos e bactérias intestinais, o que pode ter importantes implicações no tratamento de doenças autoimunes e do cancro. Outra apresentação discutiu como as células T CD8+, que atacam células infetadas ou cancerígenas, são ativadas durante infeções virais. Este conhecimento pode levar a melhorias nas vacinas e nos tratamentos oncológicos que utilizam as próprias células imunitárias do corpo.
Um tema recorrente foi como os tumores interagem com o seu ambiente e escapam à deteção imunitária. Uma apresentação revelou que o bevacizumab, um fármaco conhecido por bloquear o crescimento de novos vasos sanguíneos, também altera as células imunitárias chamadas macrófagos dentro dos tumores, mostrando uma nova forma de como o fármaco funciona. Outra apresentação discutiu como os vasos linfáticos, que ajudam a transportar células imunitárias, influenciam a capacidade do sistema imunitário na deteção e combate de tumores. Além disso, os investigadores descobriram que as alterações nas células que revestem os tumores do fígado podem bloquear as células imunitárias (células T CD8+), o que pode afetar a eficácia da imunoterapia.
A sessão final explorou como o envelhecimento afeta o desenvolvimento e tratamento do cancro. As mudanças no metabolismo do corpo à medida que envelhecemos podem alimentar o crescimento e disseminação do cancro, ao mesmo tempo que enfraquecem a capacidade do sistema imunitário de combatê-lo. Estas descobertas sublinham a importância de desenvolver terapias oncológicas especificamente adaptadas para doentes mais velhos.
Olhando para o futuro, o #CRSy24 sublinhou o papel crítico da colaboração interdisciplinar na investigação do cancro, reunindo investigadores, clínicos, experts em tecnologia e associações de doentes. Ferramentas emergentes, como a genómica funcional espacial, o sequenciamento de ARN de célula única e técnicas avançadas de imagem, estão preparadas para ajudar a dissecar as interações complexas entre tumores e o corpo com uma precisão sem precedentes. Ao destacar estas intrincadas interações, o #CRSy24 levou-nos um passo mais perto de tratamentos personalizados e eficazes que melhorem os resultados dos doentes.
*A Fundação Champalimaud agradece a todos os oradores, participantes, patrocinadores e organizadores que tornaram o #CRSy24 possível.*
Texto de Hedi Young, Science Writer e Content Developer da Equipa de Comunicação, Eventos & Outreach da Fundação Champalimaud.